sábado, junho 5

O ARQUIPÉLAGO DA BERLENGA



Este artigo foi publicado no Jornal “GAZETA DO SUL” a 2 de Agosto de 1986 na rubrica MAR ADENTRO:

«A RESERVA NATURAL DA BERLENGA


Um bem por mal necessário

O interesse pelo Mar e pelas coisas do Mar cresce em Portugal, sobretudo através de grupos ecológicos que, para além do mero desporto ou recreio, dão aos seus trabalhos e iniciativas um teor científico e de interesse comunitário. A defesa do ambiente, das espécies e do planeta, merece-lhes carinho e entusiasmo. Por isso, e porque entre os nossos milhares de assinantes, o Mar desperta também cada vez maior interesse, vamos publicar crónicas sob o título geral de “MAR ADENTRO”. Começamos com uma crónica do nosso habitual colaborador e técnico abalizado, José Douradinha e do Grupo de Actividades Subaquáticas e Ecológicas do Montijo.
A 3 de Setembro de 1981 foi publicado no Diário da Republica o Decreto-lei nº 264/81 que reconheceu e criou a Reserva Natural da Berlenga.
Os ecologistas responderam à infeliz necessidade de se criarem parques e reservas naturais, terrestres e subaquáticas.

O Decreto-Lei começa assim:
…«A algumas milhas da costa portuguesa, a noroeste de Peniche e de Cabo Carvoeiro, afloram acima da superfície do mar alguns maciços graníticos com grande valor natural, sobretudo localizados na Ilha da Berlenga, a qual ocupa uma área terrestre de cerca de 78ha.
O mar que envolve, de grande riqueza ictiologica e de águas excepcionalmente claras, constitui um património de incalculável valor, não só como local de criação de peixes mas também como campo de actividades subaquáticas, conhecido internacionalmente pelas suas qualidades.
A flora da Berlenga, cujo número de espécies naturais ultrapassa as oitenta, inclui quatro espécies endémicas além de outras três com áreas de distribuição muito restrita, interessando preservar umas e outras.
O seu interesse no aspecto ornitológico é também notável, pois constitui local de nidificação de muitas aves e ponto de passagem de algumas espécies migradoras.
Do ponto de vista recreativo, como o comprova já o numero de visitantes que anualmente ali vão, no Verão, constitui um potencial que, ordenado e controlado, poderá ainda sofrer consideráveis melhorias, sem que os valores naturais sejam degradados e perdidos.
Assim, constitui a Ilha da Berlenga um potencial recreativo e um enorme valor natural em constante risco de degradação ou perda que interessa defender e preservar» …

Pelos seus artigos que assim começa, aquele Decreto-Lei definiu zonas de utilização específica, com áreas de reservas e recreio, natural e parcial, integral e marinha.
Sentiam assim, os amantes da natureza que finalmente em Portugal se começava a reconhecer a indiscutível necessidade de se criarem zonas de reserva, que previligiados pela sua situação geográfica e riqueza natural seriam a derradeira dádiva do homem às restantes e infelizes espécies deste planeta.
Nem sempre a Lei surge efeito e a maior parte das vezes fica muda, letra morta e quando não surda para sempre!...
Visitámos a Ilha da Berlenga, em terra e no mar, no seu seio até ao fundo e vimos e sentimos que tudo que tudo o que estava escrito e tinha sido idealizado pelo legislador era grosseiramente ignorado.
Vimos gente na zona considerada reserva natural integral apanhar ovos dos ninhos, espantar os animais com gritos e gestos agressivos, lançar pedras, dar comer, fazer lixo, etc. Enfim uma série de actos reprováveis que só o esclarecimento ou melhor, e educação poderia neutralizar.
Saímos para o mar e o nosso grupo mergulhou depois no seu seio até ao fundo. Vimos a fauna e a flora ainda rica, exuberante e a cada passo, melhor fraseando, a cada “barbatanada” avistámos os vestígios incontáveis dos naufrágios ocorridos no tempo.
Sabemos das riquezas arqueológicas submersas nos despojos espalhados pelo fundo e alvitrámos o trabalho imenso que a Divisão Subaquática do Museu Nacional de Arqueologia teria de intentar para salvar um património que é nosso e deve ser protegido dos furtivos e disfarçados barcos estrangeiros que ali vão com equipamento subaquático sofisticado.
Sabemos também que no mar, nos Ilhéus das Estelas e Farilhões e até na Berlenga se continua a capturar peixe com o uso ilegal de explosivos e redes de arrasto e cerco de malha fina. Os grandes navios que passam ao largo continuam a despejar descaradamente os seus tanques causando graves danos às espécies em redor da Ilha.
Os visitantes numerosos, durante e época balnear causam também danos no meio ambiente com lixo que lançam em terra e no mar.
Cabe às nossas forças Armadas, Marinha e Força Aérea, guardar a nossa ares marítima e terrestre e colaborar com as entidades que gratuitamente intentam acções de protecção ao nosso património arqueológico submerso.
Pelo § 2º do artº 11º do Decreto-Lei que criou a Reserva da Berlenga, fazem parte do Conselho Geral as seguintes entidades:
Secretaria de Estado das Pescas; Câmara Municipal de Peniche; Direcção Geral dos Portos; Direcção Geral dos Serviços de Fomento Marítimo; Direcção Geral do Turismo; Federação Portuguesa de Actividades Subaquáticas; Centro Português de Actividades Subaquáticas; Associação «Amigos da Berlenga».
Estas entidades, responsáveis pela direcção e dinamização da Reserva da Berlenga, até à presente data, desde a publicação do Decreto-Lei nunca reuniram nem procuraram isoladamente tomar qualquer iniciativa correspondente à função que lhes foi confiada. Apesar de no 1º § do artº 14º do mesmo DL., ter sido estipulada uma verba para execução e dinamização das actividades de estudo e recreativas, adequada ao Orçamento do Serviço Nacional de Parques, Reservas e Património Paisagístico, não foi ainda essa verba aproveitada no sentido de criar infra-estruturas de apoio às actividades subaquáticas que o mesmo DL. Contempla como sendo o local internacional reconhecido como ideal para essa actividade.
A Federação Portuguesa de Actividades Subaquáticas com a sua nova direcção pretende dinamizar o estudo das espécies das Ilhas que constituem o arquipélago e activar acções de consciencialização e preservação das zonas degradadas. O Grupo de Actividades Subaquáticas, Estudo e Defesa Ecológica que faz parte da Federação  “GASEDE”  que faz parte da Direcção da Federação, em colaboração com outras instituições, grupos e clubes, estruturarão a efectiva protecção da Ilha da Berlenga».

A Berlenga hoje é uma zona protegida e todas as posturas apostas no Decreto-Lei, que lhe foram atribuídas são escrupulosamente cumpridas.
VER, HISTÓRIA DA BERLENGA:


                 

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