sábado, março 6

O MERGULHO E A FISIOLOGIA HIPERBÁRICA




O mergulho com escafandro autónomo, de circuito aberto, com ar atmosférico está limitado à profundidade máxima de 80 metros. O ar seco contém, em volume, cerca de 78,09% de nitrogénio (azoto); 20,95% de oxigénio; 0,93% de argónio; 0,039% de gás carbónico e pequenas quantidades de outros gases. O ar contém uma quantidade variável, em média 1% de vapor de água. À profundidade de 80 metros atinge-se a pressão parcial, na mistura (oxigénio) de 1,2kg.p/cm2; a mais profundidade sofre-se, ao que se chama de "hiperóxia", ou seja, intoxicação pelo oxigénio. Numa explicação mais simples para os que não conhecem os pormenores, é como forçar as nossas células a consumirem oxigénio até ao limite (p/exp.: quando se abana uma fogueira activa-se a chama porque estamos a enriquece-la com oxigénio). Da mesma forma, quando se mergulha com escafandro de circuito fechado ou seja com oxigénio puro  (caso dos militares ou fotógrafos submarinos, por não fazerem bolhas) a profundidade limite é de 12 metros. A esta profundidade atinge-se a pressão “parcial” de 1,2Kg. p/cm2, limite de pressão para se respirar oxigénio puro. Este sistema de oxigénio puro é de utilização proibida a amadores. Portanto existem dois sistemas de escafandros, os de circuito aberto cujo ar respirado é libertado em bolhas e os de circuito fechado que não é libertado mas reciclado por catalisadores em processo contínuo. Quando se mergulha, o nosso corpo fica sujeito à pressão exterior do meio aquático que aumenta 1Kg. p/cm2, por cada 10 metros de profundidade desde a superfície (pressão parcial). A pressão total é calculada, acrescentando 1Kg de pressão atmosférica a que todos estamos sujeitos ao nível do mar que varia ligeiramente com a temperatura que modifica a pressão atmosférica, inversamente proporcional, à mesma altitude, menor temperatura, maior pressão, embora no mergulho a pressão atmosférica só seja relevante no mergulho em altitude e na diferença de densidade da água do mar e da água doce. Portanto quando mergulhamos no mar, a 30 metros estamos sujeitos à pressão parcial de 3Kg p/cm2, mais 1kg de pressão atmosférica, ou seja, à pressão total de 4kg.p/cm2. Como se referiu acima, simplificando na utilização no mergulho, o ar atmosférico ao nível do mar é de 80% de azoto e 20% de oxigénio (1% de gazes raros não têm relevância no mergulho). Por questões de segurança, embora o limite seja 80m, a profundidade máxima aconselhada é de 40m, onde, sem ultrapassar a curva de segurança estabelecida pela tabela da CMAS, se pode permanecer 10 minutos.
O mergulho tem que ser previsto, calculado pela profundidade máxima atingida e pelo tempo de duração, iniciando-se depois a subida até à superfície. Embora os modernos computadores de mergulho forneçam todas as informações necessárias para a subida, velocidade e patamares de descompressão, de todas as profundidades atingidas durante o mergulho incluindo até a cadência respiratória, o mergulhador tem que estar preparado com todos os conhecimentos necessários teóricos para coloca-los em prática em situação urgente, qualquer surpresa, a súbita eventualidade de avaria do computador.
Existem dois tipos de escafandro: autónomo e semiautónomo. O primeiro é com o reservatório de ar “garrafas” e aquele último é o que está ligado à superfície por uma mangueira que fornece o ar respirável, conhecido por “narguilé” ou cordão umbilical também utilizado nos mergulhos de grande profundidade (mergulho de saturação). 
Nestes dois tipos de escafandros são usadas várias misturas respiráveis: o “nitrox”, hoje usado pelos amadores e que se baseia na manipulação da mistura oxigénio/azoto, diminuindo este último gás, o azoto até 20%, aumentando assim o oxigénio na mistura, permitindo uma maior permanência de mergulho e um menor período de descompressão na subida, diminuindo no entanto a profundidade máxima permitida, porque se atinge, a menor profundidade, a hiperóxia (intoxicação pelo oxigénio).
O mergulho de saturação é exclusivo dos mergulhadores profissionais especializados (p/exp: em Offshore), equipados para isso com escafandros especiais para o efeito e com misturas respiráveis que chegam, algumas a ser secretas entre empresas multinacionais, que prestam esses serviços e possuem técnicos e laboratórios próprios de investigação. Lembremo-nos do caso do submarino Russo, o Kursk, cujo pedido de salvamento tardio foi solicitado à Noruega que possui tecnologia de ponta no mergulho a grandes profundidades.
Quanto à descompressão:
O tempo de mergulho conta-se desde que se começa a mergulhar (imergir) até que se começa a sair do fundo para a superfície (emergir).
Quando respiramos qualquer das misturas (oxigénio/azoto) usadas pelos amadores, o oxigénio é metabolizado pelo organismo através das células pela circulação sanguínea; o azoto, residual, obriga-nos a paragens na subida que vão desde os 12, 9 até aos 3 metros abaixo da superfície (tabela da CMAS - Francesa) ou dos 10 até aos 5 metros (tabela da BSAC – Inglesa); a PADI Americana utiliza as tabelas Inglesas; os alemães utilizam, exclusivamente, uma tabela própria, (VIT – Verband Internationaler Tauchschulen), que é uma mistura das duas indicadas; são pouco divulgadas no exterior embora utilizadas, por eles, no mergulho amador e concedidas a não alemães por deferência exclusiva, continuam a ser os mais rigorosos nas passagens de licenças e dos europeus que mais mergulham no estrangeiro.
O mergulho em altitude:
Quando mergulhamos num lago ou em qualquer outro local muito acima do nível do mar temos que fazer os devidos acertos à pressão atmosférica, com um altímetro e com tabelas próprias ou com os modernos computadores de mergulho que assumem de imediato todos os cálculos antes da imersão e dão, depois, na subida, o tempo de descompressão, bem assim como as novas tabelas e computadores para a utilização de nitrox.
A diferença do pré-afogamento em água do mar ou em água doce:
O nosso organismo é hipertónico como a água do mar, a água doce é hipotónica. Na água do mar uma pessoa em pré-afogamento, embora inunde os pulmões com água, esta não se dilui no sangue, ao contrário do que acontece na água doce. Assim, o salvamento no mar pode demorar cerca de 15 minutos até ao R.C.R. (reanimação cardiorrespiratória), passado esse tempo qualquer pessoa se afoga, falece por asfixia. A água doce dilui-se, por osmose no sangue provocando quase de imediato lesões cerebrais irreversíveis. Em qualquer dos casos sofre-se um inevitável enfisema pulmonar.
Os profissionais aquando no mergulho de saturação respiram hélio, árgon ou "hidrogénio" ou outras misturas, em substituição parcial do azoto. São precisamente estes gases, menos residuais, que os obrigam às longas e incómodas descompressões em câmaras especiais de superfície, acopladas à camara de saturação, imersa depois até ao local de trabalho e acopladas depois do mergulho, na superfície, até à descompressão total que pode demorar semanas.
O oxigénio, como toda a gente sabe, é metabolizado pelas células do organismo, mas o azoto mistura-se no sangue e satura-o conforme a pressão exterior. P/exp: é como uma garrafa de água gasosa; quando lhe abrimos a tampa repentinamente, entorna, porque o gás saturado se libertou abruptamente. O mesmo aconteceria no nosso sangue se não procedêssemos à libertação do azoto (narcose) pelas vias respiratórias, com as paragens prévias dos patamares de descompressão. O mergulhador na descompressão deve manter uma maior amplitude respiratória; total expiração e média inspiração, embora o deva fazer, controladamente, durante todo o mergulho, para se evitar assim a saturação das vias respiratórias aéreas não compressíveis (laringe, faringe e esófago) com dióxido de carbono (CO2).
Porque a libertação de um gás num líquido saturado é mais rápida que a saturação, os mergulhadores ficam obrigados às tais paragens, antes da superfície, chamadas patamares de descompressão, já indicadas, segundo as tabelas referidas e consoante a que estiver a ser usada no momento da emersão. Um mergulho de 30 metros, sem obrigação a paragens de descompressão não deve ultrapassar os 25 minutos e a emersão deverá ser efectuada à velocidade de 1 minutos por cada 2 metros, num total de 15 minutos, desde o fundo até à superfície, constituindo essa velocidade de subida uma descompressão.
Mais dois acidentes podem ocorrer durante ou após o mergulho, mais perigosamente nos últimos 10 metros abaixo da superfície: A vertigem e a embriagues das profundidades.
A vertigem tem por sintoma a perda do equilíbrio; o mergulhador deixa de conhecer onde fica a superfície, pode ser causada por uma lesão no ouvido, uma rotura repentina do tímpano por bloqueio da Trompa de Eustáquio ou outras causas ligadas ao movimento (síndrome de Maunier).
A embriagues da profundidade é causada pela incidência do azoto no sistema nervoso central e manifesta-se como uma embriagues alcoólica (comportamento hilariante) que normalmente ocorre após o mergulho mas, perigosamente pode ocorrer durante a imersão, deixando o mergulhador de ter consciência da realidade. Conhecem-se casos em que o mergulhador procurou dar ar aos peixes, em estado completamente “ébrio”.
Por último: considerando que o ser humano não é portador de guelras e que só pode visitar o "MUNDO SUBMERSO" munido de ar "engarrafado" e outros equipamentos, qualquer emergência na situação de submersão não lhe permite vir à superfície socorrer-se de ajuda, todos os problemas ocorridos, obrigatoriamente, têm que ser resolvidos no fundo, com o auxílio dos companheiros, não podendo ser esta uma actividade individualista.
Nota: 99,9% dos acidentes no mergulho com escafandro, resulta a MORTE. Como dizia antigamente Fidel de Castro (amante do mergulho) "entrar é fácil, sair é que é pior".
Aviso a todos os visitantes (a mais radical de todas as actividades) do Reino de Neptuno: A única forma de ir e voltar é obedecer às regras, conhecer a sua fauna e flora os seus habitantes mais perigosos e o mar... Obedecer-lhe inequivocamente e venerá-lo, sem querer combater a sua magnitude.



José Douradinha.
Mergulhador amador CMAS, Grau 3; instrutor FPAS de mergulho em apneia e escafandro.



CMAS: Confederação Mundial de Mergulho;
FPAS: Federação Portuguesa de Mergulho.
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